Agora, após a divulgação do relatório do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), quando problemas do clima e da água voltam à pauta, vou trazer mais uma vez um assunto que abordei numa postagem aqui há quase um ano e que até agora não teve conseqüência.
Segundo a legislação de entorpecentes em vigor (DL 891, de 25/11/1938, itens 13 e 14), o uso de folhas de coca e suas preparações é terminantemente proibido no país, assim como a utilização de cocaína, seus sais e preparações. A lei faz distinção clara e cita todas as formas proibidas, tanto quanto ao uso, cultivo, transporte e comercialização. O item 13 abrange a folha de coca e suas preparações; o item 14 veta a utilização de cocaína, seus sais e preparações.
Ou seja: em estrito respeito à lei, a Coca-Cola não poderia ser comercializada no país.
Você arguto leitor, leu sobre o assunto em algum lugar?
A Coca limitou-se a um comunicado curto em que afirmava que há muito tempo não usava folha de coca em seu preparo.
No entanto, a agência peruana antidrogas, DEVIDA, disse que a companhia compra 115 toneladas de folha de coca do Peru e 105 toneladas da Bolívia por ano.
- "Se já retiraram esse ingrediente da Coca-Cola, então por que seguem comprando?"
Em um dos comentários sobre a postagem, uma leitora que se identificou como Cláudia Gonçalves enviou-me um link de uma reportagem do Le Monde Diplomatique. Aquele link caducou, mas descobri o novo.
A reportagem do Diplô mostra um quadro aterrador, decorrente da utilização da água pela Coca e sua irmã siamesa, a Pepsi, no Kerala, na Índia, e a luta das mulheres do local contra as gigantes multinacionais.
As duas empresas possuem atualmente noventa “usinas de engarrafamento”, que são na realidade nada mais que “usinas de bombeamento”: 52 unidades pertencem à Coca-Cola e 38 à Pepsi-Cola. Cada uma delas extrai entre 1 milhão e 1,5 milhão de litros de água por dia.
Essas práticas resultaram na secagem de 260 poços, cuja escavação tinha sido garantida pelas autoridades para servir às necessidades de água potável e para a irrigação agrícola. Nesta região do Kerala – chamada “celeiro de arroz”, em razão de um rico ecossistema dotado de água abundante – os rendimentos agrícolas diminuíram 10%. O cúmulo é que a Coca-Cola redistribui aos camponeses, sob forma de esterco, os dejetos tóxicos produzidos por sua usina. Os testes efetuados, no entanto, mostraram que este esterco tem um forte teor de cádmio e de chumbo, substâncias cancerígenas.
Pergunto: será diferente aqui no Brasil? Você, arguto leitor, leu alguma reportagem a respeito?
Parece que antes do compromisso com o leitor vem o compromi$$o com o anunciante. Essa é a ética dos jornalões?